domingo, 11 de agosto de 2013

ARGENTO, OS LUXARDO E A FERA CARIOCA: PARTE 1

Quando proseei com o cineasta, pesquisador e 'buona persona' italiano Luigi Cozzi - em Roma, na loja 'Profondo Rosso', e no Rio, durante o festival 'Fantaspoa no Rio' (maio de 2013) -, não perdi a oportunidade de perguntar sobre A FERA CARIOCA (Carioca Tigre, Itália/Brasil, 1976).

 A FERA CARIOCA

O filme é uma de minhas obsessões inexplicáveis desde a década de 1980.

Abre parêntesis:

Assisti um trecho de A FERA CARIOCA na TV, à noite, por volta de 1983.

A FERA CARIOCA no 'Sala especial', da TV Record, em 1984

Desde então, nunca mais consegui rever o filme. 

Não vi reprise na TV, não saiu em VHS no Brasil nem em DVD na Itália. Não existe nenhuma resenha - "user review" - no IMDb (Internet Movie Database). Até o site da Cinemateca Brasileira lista o filme apenas como CARIOCA TIGRE (o título italiano) e credita - erradamente - Lima Duarte e Ursula Andress no elenco.

'Locandina' italiana

Fecha parêntesis.

Cozzi é parceiro de trabalho do 'maestro' Dario Argento desde QUATRO MOSCAS SOBRE VELUDO CINZA (4 mosche di velluto grigio, Itália/França, 1971), no qual foi coautor do argumento e assistente de direção - 'ganhando a vaga' do titular da posição, Roberto Pariante. O filme foi uma coprodução da Paramount com a Seda Spettacoli, companhia de Salvatore Argento e seu filho, Dario, criada em 1969 (o nome SEDA é a junção das iniciais dos nomes de ambos, Salvatore E DArio). 

Cinco anos mais tarde, a Seda produziria, em parceria com a brasileira Cinemática Produções - do português radicado no Brasil Roberto Acácio -, A FERA CARIOCA, parcialmente rodado no Rio de Janeiro.

Apesar da presença do popular comediante italiano Aldo Maccione no elenco e da trilha sonora de Chico Buarque, Vinícius de Moraes e Toquinho, o filme foi um fiasco de público e crítica, tanto na Itália como no Brasil (o que pode até explicar, mas não justifica a "invisibilidade" da 'fera').

Seria a penúltima produção da companhia: o canto do cisne foi SUSPIRIA (Itália, 1977).

O que teria trazido Salvatore e sua trupe ao Rio?

Abre parêntesis [2]:

Gianna Maria Canale. Studio Luxardo
A mãe de Dario, a fotógrafa de moda Elda Luxardo, foi responsável, ao lado do irmão, Elio, por - como define o próprio 'site' da Galleria Luxardo - "marcar uma época" na fotografia italiana. Nos anos 1930, no estúdio da via del Tritone, 197, por onde passavam intelectuais, artistas e desportistas, os Luxardo revolucionaram a fotografia moderna, trabalhando a luz com perfeição e recriando o "mito da beleza, o culto ao corpo". Nem a guerra e a devastação impediram o sucesso da família: no pós-guerra, com o advento dos concursos de Miss Itália, os irmãos foram responsáveis pelos primeiros "glamour shots" de jovens divas como Gina Lollobrigida e Sophia Loren. Tal como seus fotografados, ficaram famosos e ricos. Dizia-se que não havia celebridade que não quisesse ser clicada pelos Luxardo. Colaboraram com as principais revistas de decoração, moda e cinema da Itália. Amigos da aristocracia, viveram intensamente a "dolce vita" dos anos 1960.

Nu. Elio Luxardo
Claudia Cardinale. Studio Luxardo
Vittorio De Sica. Studio Luxardo
Sophia Loren. Elio Luxardo
Dina Sassoli. Elda Luxardo

Mas Elda gostava mesmo é de passar férias no Rio de Janeiro.

Parêntesis dentro do parêntesis:

No início do século 20,  o jovem fotógrafo Alfredo Luxardo foi um dos muitos italianos que vieram tentar a sorte no Brasil. Junto com a esposa, Margherita, "Aldo" sai de Pisa (Itália) e fixa residência em Sorocaba (SP), mas o ofício o leva aos mais remotos cantos do país. No Brasil, nascem os quatro filhos do casal: Elio, Aurora, Elda e Aldo. Segundo a  Enciclopédia Sorocabana, Alfredo Luxardo "era um fotógrafo italiano que foi obrigado a emigrar ao Brasil à procura de melhor sorte, e havia se especializado na reprodução e retoque de imagens de falecidos, para colocá-las nas lápides funerárias". 

Ainda segundo a Enciclopédia, o primogênito Elio "trabalhou para o governo brasileiro como operador cinematográfico e documentarista esportivo" antes do regresso à Itália, em 1932.

Artista esculpindo busto de Mussolini (1930). Elio Luxardo.
Mais sobre a vida de Elio Luxardo e seu trabalho no serviço de propaganda fascista - envolvimento que o levou à prisão no campo de concentração de Bresso, pouco antes do fim da guerra - na Wikipédia italiana.

Líbero Luxardo
Outro sorocabano ilustre, o pioneiro cineasta Líbero Luxardo, filho do fotógrafo italiano Julio Luxardo e codiretor do documentário ALMA DO BRASIL (RETIRADA DE LAGUNA) (1930/1931), de duas co-produções com a Cinédia, de Adhemar Gonzaga, CAÇANDO FERAS (1936) e ARUANÃ (1938) - com exteriores rodados no Rio das Mortes, em meio aos índios Javaés - e do primeiro filme longa paraense, UM DIA QUALQUER (1962), é, supostamente, primo de Elda Luxardo, como afirma a pesquisadora Maria José Mesquita. Numa entrevista quando de sua passagem pelo Rio de Janeiro, Argento falou das histórias que a mãe contava sobre o Marechal Rondon, o militar e sertanista brasileiro. 


Set de MARAJÓ, BARREIRA DO MAR (1964): Líbero é o de chapéu de palha, à direita
Set de UM DIA QUALQUER, o primeiro longa paraense

Infelizmente, não tive tempo suficiente com o 'maestro' durante sua passagem pelo Rio em 2011 para esclarecer tantos mistérios. Só deu mesmo para pegar os autógrafos nos cartazes.

Eu e Argento (2011)
Fim do parêntesis dentro do parêntesis.

Cozzi contou que Elda não sossegou enquanto não convenceu o marido, Salvatore Argento, a fazer um filme no Rio de Janeiro.

Poderiam unir o útil ao agradável: trabalhariam e desfrutariam do Rio.

Nascia A FERA CARIOCA.

Fecha parêntesis [2].

Fim da PARTE 1.




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